Você Quer Estar Certo ou Ser Feliz?
Imagem de Jason Rosewell @jasonrosewell (Unsplash)
“Você quer estar certa ou ser feliz?” foi a pergunta que uma amiga me fez certa vez quando relatava para ela a discussão um tanto acirrada que tinha tido com outra pessoa. Durante a discussão, eu ‘sabia’ que estava certa, afinal estava sendo lógica e racional em meus argumentos, e não entendia como essa pessoa não conseguia ver o que eu estava mostrando tão claramente. Ela, por sua vez, vivenciava uma experiência semelhante (sentia que estava completamente certa!) e consequentemente o debate ficava cada vez mais aferrado, com o volume das vozes subindo, leves agressões e um sarcasmo imprudente intercalando o que estava se tornando uma competição sonora, como se a altura da voz fosse convencer uma ou outra de determinado ponto de vista.
Quando minha amiga me fez essa pergunta, eu já me encontrava calma e capaz de ver a armadilha em que tinha caído, mas estava ainda completamente certa da minha posição. Não podia enxergar como qualquer pessoa de mente sã e racional seria incapaz de ver o mesmo. Ao refletir sobre o que ela me perguntou, pude mais claramente constatar os seguintes pontos:
- Primeiramente, e obviamente, nem todos pensam da mesma forma, e ao chegar-se a um impasse numa determinada situação ou ideia, vale lembrar que continuar uma discussão aferrada só para se ter o prazer de mostrar a nossa ‘verdade’ é realmente uma perda de tempo e energia.
- Vale lembrar também que cada ser humano chega a cada momento com uma pletora de experiências, ideias, informações, condicionamentos etc. que moldam a personalidade e o comportamento desta pessoa naquele momento. Existe uma multitude de fatores, sejam eles físicos, emocionais, mentais, biológicos, entre outros, que influenciam nossas perspectivas e atitudes no decorrer da vida. Então tratar alguém como se essa pessoa fosse e pensasse como nós é um erro que cometemos frequentemente. Temos também o infeliz hábito de julgar pessoas como se estivessem na mesma condição em que estamos no momento quando gratuitamente oferecemos nosso julgamento. O que está por trás de determinado comportamento ou ponto de vista em diversos momentos de nossas vidas? Se a situação fosse inversa, ou seja, se nós estivéssemos na mesma situação, vivendo as mesmas circunstâncias, com a mesma bagagem emocional, social e psicológica da outra pessoa, será que não agiríamos ou pensaríamos da mesma maneira ou até pior?
- E finalmente, sobre a pergunta propriamente referida anteriormente, vale a pena carregar tanto estresse, sofrimento e aborrecimento só para mostrarmos que estamos certos?
Parece simples, mas esse tipo de postura é extremamente difícil de ser vivida. O instinto de estarmos certos é muito forte, e só com muita presença e uma percepção clara somos capazes de realmente começarmos a enxergar além dos vários condicionamentos e vieses de que todos somos vítimas.
Como essa presença se manifesta quando precisamos dela? A princípio, como tudo na vida, a prática constante traz maior possibilidade de acessarmos algo com mais facilidade, ou seja, no caso mencionado acima, a prática frequente do mindfulness, através do exercício da meditação séria e sistemática, nos dará oportunidades de testemunhar as tendências de nossas mentes, nossos pontos cegos, a influência de nossos sentimentos e emoções sobre nossos pensamentos e ações, e de como a meia-vida de um sentimento é curta quando temos consciência do que se passa em nossos corpos e mentes no momento em que um sentimento vem à tona. Isso conduz a maior calma em momentos estressantes.
Tente isso na próxima vez que você se encontrar numa situação de discórdia: preste atenção às sensações presentes em seu corpo (batimento cardíaco, suor nas mãos, leve tremor, secura na boca etc.). Leve a sua atenção para determinada parte do seu corpo, eu particularmente sempre me concentro nos pés, sentindo sensações presentes naquele momento, e focalizando no aterramento ao chão. A mudança de foco oferecerá uma oportunidade de romper a sedução de provar a “verdade” de seu ponto de vista. Aí então pense; ‘essa pessoa na minha frente é igual a mim’ (ver prática) e respire fundo. Você vai perceber a melhor solução para o momento em que se encontra (seja pedir licença e sair, acalmar-se e enxergar o outro e a si mesmo com mais compaixão, ouvir sem julgar, oferecer palavras como: “eu vejo seu ponto de vista, porém acho que no momento teremos que concordar que divergimos sobre este assunto.” Você verá como isso irá reduzir a carga emocional e o estresse nesse momento, beneficiando a você e a outra pessoa. Lembre-se bem desta frase: você quer estar certo ou ser feliz?