Ano Novo...Vida Nova!
É comum fazermos resoluções de ano novo. Bem intencionados, contemplamos alguma mudança, criamos metas, idealizamos possíveis projetos. E assim, ano após ano, apostamos em mudanças positivas e no crescimento pessoal. A minha experiência, porém, me mostra que apesar de boas intenções, normalmente falta-nos motivação para transformamos as intenções em ações e mantemo-las como tais por muito tempo. Começamos com muita boa vontade e a maior garra, mas à medida que o tempo passa, vamos perdendo o pique e finalmente tudo volta a ser como era antes. Assim, hábitos que já nos pesam agora, se solidificam cada vez mais com o decorrer do tempo e se tornam parte de nosso caráter.
É como uma valeta que se forma no barranco de uma colina com o cair da chuva. No começo a água que cai faz uma pequena vala que corre colina abaixo. Com o passar do tempo e muitas chuvas, esta vala se torna mais larga e profunda, até o ponto em que se transforma quase que num córrego. Assim são os nossos condicionamentos e hábitos. Desde a infância criamos uma persona baseada no que observamos, deduzimos, e internalizamos – para a nossa própria sobrevivência, criamos camadas físicas, mentais e emocionais várias que se tornam rígidas com o tempo. Raramente exploramos nosso mundo interior; normalmente vivemos levados por uma enxurrada de pensamentos que não nos dão um momento sequer de sossego e nunca questionamos a veracidade destes pensamentos, muitas vezes resultantes de mensagens propagadas pelo nosso meio ou por histórias que criamos, como se fossem verdades. Acreditamos em nossos pensamentos como se fossem fatos reais e comprovados. Assim, frequentemente, nos vemos como vítimas do mundo, da vida, do destino, dos defeitos alheios, de nossas fraquezas, etc. Assim vamos levando a vida sempre com ótimas intenções de mudanças pessoais, mas nos deixando levar por padrões rígidos que carregamos desde a infância, pouco explorando a verdade mais profunda que não queremos ou não podemos enxergar. Acho que é por isso que enfrentamos tantas dificuldades em transformar a motivação e a intenção em ação duradoura.
Os planos que fazemos são variados: comer melhor, exercitar-se com mais frequência, ler mais, beber menos, parar de fumar, desperdiçar menos tempo na internet, ter mais indulgência para com os outros, julgar menos, consumir de maneira responsável, etc. A lista não tem fim! Mas por que dificilmente conseguimos levar estes planos adiante por muito tempo?
É aí que entra mindfulness! Dois aspectos são importantes ao observarmos nosso comportamento e introduzirmos mudanças positivas através da atenção plena: a sinceridade e a compaixão. Como exemplo, utilizarei o caso de alguém que gostaria de fazer mais exercícios físicos. Digamos que a pessoa citada não faça nenhum exercício e gostaria de gradualmente chegar a uma condição física ideal para sua idade. A pessoa faz pesquisas, formula planos, entra para uma academia, etc. Tudo vai bem por um mês ou dois até que as atividades no trabalho aumentem, ou aquela série imperdível da Netflix dificulte o acordar mais cedo, ou a preguiça tome conta. Aí a pessoa encontra a desculpa perfeita e o resto da história todos nós conhecemos muito bem. Naquele momento crucial quando nos enganamos com nossas histórias, precisamos parar para buscar mais profundamente em nossos pensamentos o que está realmente se passando. Vale observar com sinceridade o que se passa em nossas mentes e deixar esta honestidade interior infiltrar as camadas das histórias, desculpas, percepções errôneas, culpas e tantos outros pesos que nos mantém presos a uma realidade constritiva. É comum, porém, ao examinarmos nossos pensamentos com mindfulness, sermos levados por uma torrente de culpas e sentimentos ruins. Neste momento, precisamos lançar um olhar carinhoso, compassivo e indulgente para conosco. Isso não se traduz em simplesmente dizermos: “Eu não consigo por tal razão, mas como preciso ter auto-compaixão, tudo bem. Deixe para lá.” Com mindfulness, seria mais assim: “Nas últimas duas semanas eu não fiz nenhum exercício físico como tinha planejado, principalmente porque fiquei acordada até mais tarde quase todas as noites e não consegui levantar-me cedo no dia seguinte. Estou minando meus objetivos, mas não há nada que possa fazer a respeito das últimas duas semanas, então não adianta ficar me flagelando sobre isso. Mas posso recomeçar amanhã, sem culpas e censuras e ser mais honesta e vigilante ao observar que estou caindo na mesma armadilha.” Como disse o Papa Francisco no filme Dois Papas: “A verdade é vital, mas sem amor é insuportável.”
No momento em que somos levados por crenças e padrões sem sentido estabelecidos pelo nosso meio, pelos hábitos automáticos, por experiências inconscientes; paremos, respiremos fundo, sintamos os pés no chão e tenhamos coragem de sair do piloto automático para um momento de honestidade e autenticidade. Assim encontraremos a liberdade e o crescimento interior.
Desejo que possamos todos viver mais plenamente em 2020!
Fonte da Imagem: Jamie Street @Jamie452 (Unsplash)